Menos Pior do que Eu Imagino

Enquanto eu tomava um copo de coca cola e lia ‘choke’ de Chuck Palahniuk, pensei por um momento “o Jung deve estar rindo horrores da minha cara nesse instante”. Tô impressionada com a pigmentação do meu esmalte vermelho novo, fazia tempo que eu precisava de um esmalte vermelho novo. Os meus outros secaram. Até tenho um vermelho mais escuro que comprei pra ter as mesmas unhas de uma mulher do filme do David Lynch. Não vou lembrar o título mas é bem estranho. Um thriller dramático, bem a cara do Lynch mesmo, só pra quem curte. Toca Rammstein e Marilyn Manson na trilha sonora e as cenas iniciais e finais são as mesmas de uma estrada na noite interminável. Pode parecer extremamente exagerado e de péssimo gosto (mas eu não obriguei ninguém a vir aqui e ler essa merdalhada toda que eu escrevo), falar a respeito de tudo o que se passa na minha cabeça sem muito filtro, ainda mais quando me faltam os remédios.
O Vitor é a pessoa que, creio eu, é a que mais confio pra falar as coisas sem pensar demais. Até minha mãe já me perguntou ‘por que você diz esse tipo de coisa pra ele?’ – É porquê sou sem noção e se ele tiver que gostar de mim, ele vai gostar da pior á melhor versão de mim mesma. Eu não escondo absolutamente nada dele, mesmo porquê ele finge que esquece. Ou esquece mesmo. Espero que esqueça. O Jung tá rindo (nos meus sonhos) por causa dos meus sonhos atordoantes. Eu sonho com o Vitor, sonho com a minha mãe, sonho com a escola. O problema é que eu fujo incessantemente de todas essas coisas. Da minha mãe, bem, vocês estão carecas de saber a merda da nossa relação que é péssima. Da minha parte pelo menos pois tenho pra mim que ela não sente nada por mim. Desprezo talvez. Um pouco de indiferença e talvez dúvida de “onde eu errei” ou “por que não abortei esse pedaço de bosta?”
Meu terapeuta entendeu que eu entendi que, não basta anotar os sonhos e tal. Eu tenho uma boa memória pra eles até, uma riqueza em detalhes sórdida até. Mas o que me falta é a análise. E cara, sei lá. O que porra eu vou fazer com esses sonhos com a minha mãe, onde ela me persegue, e grita, tenta me prender, ela grita e pergunta pros outros de mim. E ninguém, lá nos sonhos, percebe que ela vai vir e me matar. De surra, de paulada, de unhadas. Sinto arrepios quando lembro das unhas delas marcadas no meu braço, as peles fininhas branquinhas em quatro ondas saindo curvas uma do lado da outra. Eram as umas dela.
Eu não consegui terminar esse texto antes (lá vem mais três páginas, ô inferno) porque estava evitando a todo custo ficar em casa. E me fez bem, a Aline, a bicicleta. Ela é a pessoa mais doce que conheço. Eu já disse, o Edu é o mais sensível, a Aline a mais doce e o Vitor o meu poço infinito de confiança. Na verdade eu tô pouco me fodendo pro que ele pensa de mim mas, ele deve gostar um pouco de mim já que ainda não me deu as costas como a maioria das pessoas fazem quando me conhecem um pouco mais a fundo.
Estou numa greve de silêncio. Seria esse o nome? Coca cola com energético, essa é outra coca cola, que eu comprei ontem a noite voltando da capital. E um pacotinho de biscoito seco de chocolate. Queria muito um doce. Você também tem uma fome constante de algo que você não sabem dizer o que é? Mesmo que milagrosamente apareça a comida que você mais goste na sua frente (no meu caso, pizza). Não é aquilo. Serve, mas não é aquilo. Estou lendo mais um livro que parece que vai entrar pro ranking dos livros que mudaram minha vida, tocaram meu coração e me deixaram apaixonada. Eu me pergunto constantemente, por quê minhas esperanças na minha vida como um todo só se renova quando tenho contato com esse tipo de pessoa. Dá pra chamar Tyler Durden ou Victor Mancini de anti-heróis? Eu não sei. Mas eu os amo de todo coração.
Mancini ilustra a porra de segunda vida que eu não consigo tirar do papel.
Eu sou uma burra, eu não sei mentir, nem um pouquinho. Esse é o meu maior defeito e eu o odeio profundamente. Sabe, pensei demasiadamente sobre porque faço o que faço. (pensei baixinho, porra nenhuma, é o que você faz).
Pra quê dar aula na escola pública?
Pra quê acordar?
Pra quê tomar banho no frio?
Pra quê se culpar por uma coisa que eu não tô afim de fazer? Eu não vou fazer e ok. Foda-se.
Pra quê se sentir uma merda como mãe, filha, amiga e mulher?
Pra quê sentir culpa sabe-se lá do que?
Pra quê esperar as coisas que você quer fazer tipo agora?!
Eu tenho resposta pra metade de tudo isso mas me recuso á responder pra mim mesma. Só sigo o fluxo. Acordo, tomo banho, bebo café, faço alguma coisa o dia acaba e eu deito e durmo zapeando o celular, me irrito com a música do vizinho, odeio meus pais, odeio lidar com as pessoas no geral. Odeio esperar, vocês não imaginam o quanto.
Meu terapeuta fala isso, mas já sei. Meus pais me falavam muito isso mas eu já sei. As coisas não se constroem do dia pra noite, mas em menos de uma hora eu posso arquitetar minha morte. Em menos de dez minutos eu posso acabar com vinte e quatro anos. A Oyama tá louca tentando me convencer há semanas de que, ter vinte e cinco anos é sensacional, é uma idade excelente. Mas essa iluminação otimista só vem pra mim de verdade quando eu leio os incríveis feitos de Victor Mancini.
Eu falei pro Edu que, se eu fosse escrever um livro, eu usaria tudo o que já estava no blog e pau no cu de todo mundo. Eu não tenho visibilidade mesmo. Tanto faz. Vai ser SUPERRRR NOVOOO e incrível e podre e cheio de sombra, vão me chamar de absurda, que tesão me dar imaginar as colunas verticais em letrinhas miúdas discorrendo “Diana Lihn é inspirada por Bukowski e Palahniuk com um toque de ironia e melancolia barata que traz a tona a sombra da humanidade patética, doente e superficial em crônicas com nomes reais, encarnadas na escrita marginal”. Se pá nem vão gostar de mim porque eu sou mulher. Uma mulher com sérias crises de identidade e eu nem to falando de usar um nome falso.
O mundo seria melhor se todo mundo soubesse usar seus demônios em papel, em tinta, em arte no geral. Não pelo reconhecimento, só pela extração. E é por isso que ainda escrevo, eu preciso vomitar ao acaso alguma coisa sobre mim.
Tem coisas que não dá pra falar pro Vitor, pra Edu e pra Aline. Aí eu escrevo. Uau, eu escrevo pra um público desconhecido. Eu escrevo pro que pode vir futuramente ter milhões de exemplares pocket rodando por aí e um povo lendo “cara essa mina precisa dos remédios pra ontem”.
Eu acho uma merda esse plano perfeito pra tudo dar errado. Na cabecinha de bagre da criancinha idiota que quer agradar os pais, dançando de tutu na sala uma coreografia pra “summertime” na voz de Janis Joplin, a vida não parecia tão dura. Aí você não faz ballet porque é gorda. Você tinha tudo pra começar a fazer piano mais cedo mas ninguém notou o quanto você amava o pianinho de brinquedo. Ninguém te perguntou o que você queria fazer, mas te empurraram secretamente muitas vezes SEJA ADVOGADA, ARQUITETA, MÉDICA, VETERINÁRIA, ninguém mandou ter filho com vinte anos de idade e cinco meses de namoro. Acho que pulei muito a história, tudo bem. Mas a coisa não é só comigo. Dá errado pra muita gente que eu conheço. Tenho amigos incrivelmente inteligentes que não tem emprego, não tem voz em casa, tem que justificar o papel higiênico que usa “ah esse foi pra limpar a merda, ah esse foi pra mijar, ah gastei um pouco mais porque limpei a menstruação também”.
A merda tá tão fodida na minha mente que eu preciso tomar cuidado pra falar com as outras pessoa e não ser mal interpretada. Na frase “eu sou uma fodida que não tenho aonde cair morta, não sei andar de carro e não tenho emprego” – eu falo de mim, mas quem se enquadra e saudavelmente sabe muito bem que O SER HUMANO o maldito ser humano não é o emprego, não é a carteira, não é o status, o diploma e o dinheiro de comprar papel higiênico, bem.... Ele se ofende.
Sabe que cheguei até a me emocionar no dia que tomei a primeira dose de vacina contra a covid? Pensei, puxa, olha que bacana a vida me deu mais uma chance, tipo, tanta gente morreu e eu tô inteirona demais! – Tipo, meus exames de sangue e urina estão impecáveis. A MERDA TÁ TODA NA MINHA CABEÇA.
Aí depois que eu vi gente morrer mesmo vacinada eu voltei com a realidade áspera sem romance e sem massagem: tu tá aqui porque não sei. Aí penso baixinho que azar que eu não morri.
Dizer essas coisas meio que me deixam bem e me assustam. Ainda me importo comigo. Eu gosto de mim, um pouquinho. Estou largando um pouco aquela história bonitinha de é injusto eu ter nem vinte e cinco anos e a vida estar assim, não acho certo blá blá blá. Eu me sinto confortável e queria que as pessoas escrevessem, pintassem, recortasse, fotografasse, fizessem qualquer merda pra extrair a dor, a mágoa, a revolta e tudo que as instabiliza sem precisar estar dopada de quetiapina. Meu terapeuta vai querer me matar. Eu queria tomar o topiramato só pra não ter mais apetite. Acho, que prefiro comer igual um javali raivoso de merda do que ficar morta com olhos bem abertos não sentindo merda nenhuma. Eu não sei o que vou dizer ao psiquiatra e eu tô fodida.
Ele, o terapeuta, vai falar de novo que eu tô negando que preciso de ajuda. Ajuda, vide, remédios. Não tô falando que escrever cura tudo, mas que eu me sinto melhor, puta que pariu... É melhor do que transar. Juro.
Nesse intervalo entre os sonhos acordada e a procrastinação alimentada pela depressão ou excesso de ansiedade (eu não sei mais explicar essa porra toda que acontece dentro de mim, mas entenda como uma petrificação, independente da porra do motivo), eu deveria tipo, ok, se eu estou aqui jogada na cama, eu poderia abrir a apostila de tablaturas e deixar o baixo e o amplificador aqui do meu lado do colchão. E o que eu tô fazendo? Lendo Chuck Palahniuk, escrevendo merda pro blog, quando eu tenho redação pra treinar, física, biologia, processos bancários, matemática básica e financeira pra estudar. Eu nem sei que dia é o Enem. Sinto que vou me sair bem, eu não tô sendo irônica, sério. Não tenho esperanças sobre o concurso. Mas é bom experimentar. Conhecimento nunca é demais (falou a vagabunda que ama grasnar que a filosofia acabou com a vida dela). Ha. Ha. Ha.
Ainda não desisti de formar uma banda de punk. Vou cantar e tocar meu baixo azul da condor cheio de glitter. Quero arrancar quatro dentes. Quero andar sem mancar. Quero dançar na Milo Garage mais duzentas noites. Quero ir ao cinema. Não quero mais tomar remédio. Quero ver meu filho feliz. Quero escrever livros mais saudáveis do que as coisas que escrevo hoje em dia. Quero conhecer o Chuck Palahniuk e agradecê-lo pelo Tyler e pelo Victor, assim como eu fiz com o Ademir Pascale pelo Rafael Monte Cerquillo.
Entre o abismo da procrastinação e os sonhos acordada, eu podia fazer alguma coisa. Eu já estou fazendo. Dura uma eternidade mas é isso, tenho que esperar porque as coisas não acontecem do dia pra noite.