Racional

O racional me trai às vezes. Em algumas manhãs com o cheiro de café e a brisa gelada. Quando eu olho as caixas de chá que eu não tomo no armário. Em algumas tardes com o sol gentil na minha pele, quando o sol se põe e o céu é lindo demais, mas tão lindo que parece nos pregar uma peça. Em algumas noites que me empenho em fazer algo que eu gosto, que geralmente nós dois gostamos. No silêncio do quarto, na ausência de som e pessoas. Esquisito, ficar sozinho juntos. Que sorte seria. Mas o racional me trai, ferozmente, muito mais nas madrugadas que não consigo dormir. Onde não dá pra mentir que eu não sinto nada. Eu não sei mentir pra mim mesma. Talvez saiba ser ríspida, ser grossa, não tão acolhedora. Mas dura pouco tempo.

Eu reluto muito pois eu já cansei de escrever as mesmas coisas das outras vezes. Chega num estado tão doloroso que a dor entorpece. Aquela dor que toma de conta de tudo aqui dentro. Eu li que tylenol resolvia. Eu pesquisei como isso acontece, porque isso acontece. Eu nem sei porquê eu tô chorando. Deve ser o período menstrual. Eu comi muito açúcar. Apagar seu número não resolveu nada.

Eu leio picado, sabe? Pego muita informação ao longo do dia. Eu já li que quando os erros se repetem nas relações, é porque precisam ter resolução. Tipo, o abandono na infância me faz querer pessoas impossíveis. Eles afirmam piamente que eu não amo você, mas sim a ideia de que você vai me tirar da solidão. Eu procuro mil motivos pra deixar claro porquê eu te quero tanto. Você não entende porque nem eu consigo explicar. Eu te amo sim, e você tem que ser livre. Mas não é culpa minha se dói. Não é culpa de ninguém. Eu por muitas vezes não entendo, mas sei que lido muito mal. Eu continuo mentindo pra mim mesma que eu não tenho a mínima ideia do porque dá vontade de chorar e ouvir musica triste atrás de música triste. Os anúncios frenéticos no meio das musicas não permitiriam que o momento fosse o ato solene da cena triste da minha novela em horário nobre.

Eu me repudio muito quando escrevo da minha dor de cotovelo. Eu sinto que é tipo “olha aqui eu estou sofrendo, você viu isso?” – e eu odeio demonstrar fraqueza. Eu odeio voltar atrás. Sim, estou louca pra te pedir desculpas sobre o que escrevi anteriormente. Eu não sou de atacar as pessoas. Eu me sinto infantil. Na verdade, me comportar como me comporto quando eu não consigo ter o que quero é bem difícil de explicar. Todo mundo vira o vilão da minha história. Eu viro a cara pra todo mundo. Eu não quero e não sei e não me proponho conversar com as pessoas. Me dá nervoso. De ansiedade. Quando eu falo de incógnitas com você, de restar dúvidas, não é sobre você. É sobre eu mesma. E todo dia me pergunto, o que eu fiz? Sabendo que eu fiz o que era pra fazer. Se fosse diferente não seria eu. Eu não sei fingir. Talvez eu saiba, mas dura pouco.

Eu, se rezasse, pediria todo dia pra te esquecer. Eu não consigo não pensar em você em algum momento do dia. As muitas partes de você estão em mim, e no meu quarto, nas minhas ideias, nas minhas memórias. Eu tô farta de apontar culpados. E com toda razão, ninguém tem culpa. Mas é desesperador esse momento esquisito depois de um tempo que se ouve um “não “.

É um vazio cheio de sentimento. É uma espera por algo que não virá. É tatear um fantasma. É sentir seu beijo na minha boca mesmo depois de meses. É essa maldição amarrada no meu peito de não entender como o sentimento e a vivência do seu olhar, nas nossas mãos dadas e o meu coração a milhão, o suor e o calor e o som daquela noite. Nada disso desata daqui de dentro. Talvez eu culpe o Tavares, juro por deus que vou dar um soco na boca dele.

Eu estudo constantemente, por repetidas vezes os meus manuscritos onde “os mitos e símbolos tocam uma parte que o racional não consegue traduzir”. Qual será o seu arquétipo? Eu te vejo como um sábio. Justamente, eu gostaria de ser sábio. Eu adoraria ser como você em muita coisa. Mas gosto de mim assim como eu sou também. O explorador é interessante. Indisciplinada demais pra ser sábio, cuzona demais pra ser rebelde. Sei lá. A verdade que está só nos livros pra mim não basta, sempre tem algo a mais. E quando eu penso nos rebeldes, e em tabus, e em chocar pessoas, eu reviro os olhos. Tabu por si só é uma merda. Sexo é gostoso sim, dane-se pra quem você tá dando ou a posição que você gosta. Religião é uma desgraça e tanto faz. A ideia é muito boa mas o ser humano estraga tudo quase sempre. Sei lá, me fala um tabu aí. Tudo perda de tempo. Pra mim, pelo menos, que choco as pessoas falando o que eu sinto, sendo franca, não me importando com fatos supérfluos. Foda-se, cara, foda-se.

Antes de você chegar, eu me mantive quieta e só. Eu já te falei do Nicholas? Tudo que eu amava nele, ima inteligência magnânima, um jeito único e às vezes estranho... tudo que eu amava nele eu acabei encontrando em você. Com o adendo: o Nick era muito arrogante. Extremamente estúpido. Às vezes até desumano com suas opiniões egoístas. E você, quanta doçura e sensibilidade. Eu já cansei de te elogiar, eu morreria falando bem de você mas vai se foder que eu não vou mais te elogiar.

Antes de você aparecer, doía tanto quanto dói agora. Pra você ver que sexo não significa absolutamente nada num impasse de sentimentos, o cara não era lá grande coisa e mesma assim eu me derretia por tudo que ele fazia. Eu vi fotos dele com outra mulher e aquilo foi o fim. Sabe, descartável, usada, enganada, inútil, estúpida, um zero à esquerda. Foi assim que me senti. Mas eu permaneci quietinha. Achei que se deixasse o que eu sentisse por ele largado ali, como quem abandona a planta no jardim do quintal, ela morreria um dia e tudo bem. Até você chegar.

Se por algum acaso eu apagasse essa merda toda que eu escrevi, eu ficaria irada mas iria atrás de você pra te pedir desculpas. Nem sei pelo que. É problema meu. Eu não bato bem da cabeça. Tem muita coisa que eu não sei lidar. Mas eu to bem, fora as vontades que oscilam de te bater ou te abraçar e te esmurrar. Eu sinto muita raiva. Eu sinto muito. Tô falando sério. Eu sinto muito. Eu te amo de verdade. E você merece toda a felicidade do mundo, comigo ou não. Quem ama de verdade não tem posse e isso é importante ressaltar. O amor tá muito vulgar hoje. Todo mundo é amor na fila do banco, na padaria ou mesmo nessas relações retardadas sem pé nem cabeça. Ficar perdendo nosso tempo tentando explicar racionalmente que eu te amo como amiga e sou apaixonada por você só vai mostrar minha debilidade enorme em lidar com o abandono do racional. Esse racional do caralho que me larga e me deixa escrever um monte de merda sentimental. Ser amável nunca me trouxe nada de bom. Quando você diz que eu mereço ser feliz, eu super aceito, e eu sei disso. Lógico que eu mereço ser feliz. Mas eu queria você, também. Sabe? São coisas que eu não abriria mão.

Mas eu vou me manter quietinha. Eu queria muito de abandonar até você sumir. Talvez é por isso que eu não mantenho contato com quem já gostei um dia. Não sei lidar com a rejeição eu já escrevi tudo isso aqui mil e nove vezes. Eu vou ficar quietinha. E ninguém mais vai chegar. Eu não quero mais. Que ninguém me apresente nenhum amigo legal que se pareça comigo e que talvez eu vá gostar dele. Vai pro inferno.

Ninguém mais vai chegar. O sentimento vai morrer. Essa dor vai acabar. Eu vou aprender a lidar com isso tudo. Emocional filho da puta. Nunca me trouxe nada de bom. Nesse campo afetivo pelo menos, não.