Envelope vermelho com um beijo sem batom

Oi, filha.
Tá gata pra caralho, hein... Parabéns pra você.

Ao contrário do que a gente pensa, ficamos muito mais próximas nesse ano. Finalmente tu parou de jogar teus problemas pra baixo do tapete e foi encarar umas fitas pesadíssimas, sem mais hesitação. Choramos. Como choramos. E isso é muito bom. Lembra quando a gente não chorava mais? Doía pra caralho, aqui dentro do peito sabe? É bom chorar, meu robozinho.
Eu pensei um pouco sobre escrever pra você, e sobre o que escrever também. A gente tem passado muito tempo em silêncio. Não tem muita coisa pra celebrar, e menos ainda pra reclamar. Sério, apesar da merda que esse ano foi pra muita gente, eu penso que dei uma senhora reviravolta na minha vida. Fui pro psiquiatra, estou medicada, potencialmente bipolar e do dia pra noite, a palavra “mania” mudou completamente de sentido. Eu parei de ouvir música, parei de escrever, parei de sentir tanto. Um alívio, eu confesso. Sempre comento com o terapeuta que aquela penumbra de pensamentos e paranoia praticamente sumiu. Não é todo dia... E sim, eu ainda continuo querendo ser feliz o tempo todo. A mania acopla isso, querer mais o tempo todo, nunca estar satisfeita, Cê sabe bem como são esses sentimentos. Eles estão conosco desde que me conheço por gente.
Eu queria te agradecer mais uma vez por segurar as pontas, né. Eu não canso de dizer em muitos parâmetros de que a vida só anda quando você entende que é você por você e acabou. Lógico, dependemos dos outros pra muitas coisas mas, na hora que o cu aperta, é só a gente mesmo. Sabe que eu ensino isso pro Michael quase todo dia em algum aspecto? O padrinho dele me acha horrível por isso, mas tudo bem. A vida também é horrível na maior parte do tempo e, quanto mais cedo ele aprender isso, melhor pra ele.
Obrigada, por seguir o tratamento o melhor que você pode. Eu rio até hoje sozinha pensando no terapeuta dizendo “não é assim que funciona” – porquê você só quer tomar o remédio quando sai de casa, e ainda quer tomar doses em dobro quando acha que o dia vai ser muito caótico. Remédio pra dormir a gente ainda tá pegando as manhas de usar. Pelo menos, a gente não bebe e nem fuma há meses. Sabe, fiquei chateada essa semana pelo amontoado de (falta de) ações de uma pessoa a qual eu gosto muito. Sei lá, acho que acabou, um lance que nem começou direito. Eu não quero mais nada, nem com ele e nem com ninguém. Estou de saco cheio de ficar esperando ou jogar conforme as regras dos outros. Eu sou uma pessoa difícil e extremamente metódica. Eu gostaria que as coisas fossem do meu jeito, mas não são. E já que não são eu não quero. Já esperei tempo demais, por um sinal, um gesto, qualquer coisinha boba. Acho que não to pedindo muito, não quero me casar, não quero um pai pro meu filho. É que realmente eu cansei. Não sei te explicar, mas parece bastante com correr pra alcançar uma porta e essa porta estar cada vez mais longe á medida que corro em direção á ela. Mas tudo bem, eu reconheço a minha culpa, aliás, quando é que a culpa não é minha?
Se for pra sentir algum tipo de culpa, que seja abandonando uma coisa de machuca. Viver de fantasmas de boas lembranças, de mensagens escritas há meses, de imaginação (muito quente e) fértil por todo esse tempo já perdeu o sentido pra mim. Talvez eu não sei o que é que os relacionamentos desse tipo signifiquem. Talvez eu exija demais ou nem saiba que porra que eu quero, além de uma pessoa tão intensa que se entregue exatamente como eu me jogo no fogo sem pensar duas vezes. Já pensou alguém reciprocamente apaixonado? Quem sabe depois?
Agora falando dos amigos, temos muito á agradecer. Nosso círculo está cada vez mais reduzido, mais seleto e até mais especial. Porra, quem consegue me aguentar tanto tempo assim? A não convivência é uma coisa sagrada. Acho que lido muito melhor com as pessoas de longe. Tudo é mais bonitinho lá do horizonte. Desfiz laços, reatei alguns e firmei muito mais outros. Eu não gosto de citar nomes, mas sinto inúmeras saudades e um afeto enorme pela Aline, Yasmin, Gunter, Edu e Vitor. E cara, haja conversa, haja áudios de cinco minutos, chamadas no hangouts de duas horas e memes horrivelmente sem graça trocados. Eu costumo dizer que não gosto de conversar. Pergunte á eles, talvez vão te responder o contrário. Sou um pouco de lua, apesar do dia não fazer sentido quando não falo com a Aline e com o Vitor. É um costume muito gostoso. A gente precisa manter contato com quem a gente ama. Sério, de alguma forma eu me afastei ferrenhamente e continua cada vez mais distante das pessoas. E não pretendo mudar. Estou numa viagem muito intensa, muito tensa. E realmente preciso ficar sozinha. (tá vendo né? Quer as pessoa perto e depois quer ficar sozinha, sua doida.)
Bem. Podemos falar de trabalho? Não. Gosto do dinheiro. E modéstia á parte, foi um salto no meu saldo bancário. Muito bom, por sinal. E bem justo também já que sou paga pelas horas extras. Gosto da correria, gosto de responsabilidades (caralho em vinte e quatro anos eu nunca pensei em dizer isso), gosto de receber elogios pela minha eficiência e amo me sentir útil e ocupada. Meu trabalho é minha prioridade, na frente da minha casa. Na verdade, continuo detestando minha casa. É terrível ter um negócio grande que é teu, mas onde você vive infeliz. Eu só volto pra casa pra tomar banho e ficar com o meu filho, nada mais me importa, porém tenho obrigações sociais bem toscas para com os meus pais. Infelizmente pagar as contas não é o suficiente, você tem que aparecer ao menos uma vez na cozinha pra ouvir os dois berrando e trocando farpas como crianças. Isso quando não é algo que fiz ou deixei de fazer, e como se não bastasse isso, a disputa por atenção do meu filho entre eu e meu pai. Pode ser que eu esteja com ciúme? Sim, tenho quase certeza. Eu odeio sentir ciúme. É um negócio podre. Não gosto que sintam ciúmes de mim pois eu não sou uma propriedade de ninguém, nem minha própria. Eu sou do mundo, eu sou da terra que um dia vai guardar minha carniça putrefata, ou se o dinheiro me permitir vou me entregar ao fogo, de onde eu tenho certeza que vim. Papo de hippie, né? Eu sou fogo puro, você sabe disso mais do que ninguém.
Puxa. Estou me sentindo bem melhor do que quando me sentei aqui pra escrever. Obrigada, mais uma vez.
Acho que não tenho mais nada pra contar. O que eu posso te dizer é que, essa força que a gente descobre todo dia mais um pouquinho dela, que ela tem que continuar minando. Não vai ser fácil esse ano seguinte, sabe? Assim como este aqui não foi. Porém, você assumiu muitas fraquezas e aprendeu a pedir ajuda. Tá, to exagerando. Ainda sou muito orgulhosa, quero provar a todo custo de que posso fazer tudo sozinha e tudo impecavelmente perfeito. Isso me corrói as vezes. Olha a mania aí de novo. Ai, mulher, espero que você se dê conta logo que você faz o que você pode e já tá bem legal. Lógico, não podemos estagnar numa poça de merda e nem se afundar nela. É um trabalho gradual, uma lapidação, porra, você só tem vinte e quatro anos fia. Eu cuspi pro alto uma caralhada de vezes e tá caindo cuspe até hoje bem no meu olho, pra eu parar de falar merda. Ninguém nasce sabendo, e pelo menos a gente não votou no Bolsonaro, já é um bom caminho. Falando em política, até hoje a gente não foi atrás de saber de fato o que é a anarquia, né? Tá ficando chato só explicar que eu não aceito governo nenhum. Tem que ter uma base né, tem que saber do que você tá falando. Tirando esse rostinho bonito, tem muita inteligência, e muita preguiça. Sem roupa eu sou um máximo também mas tem mais coisa pra explorar em mim. Eu tenho muito potencial e tenho muito tempo de vida. Espero que você não se esqueça disso nos teus piores dias.
Bem... Obrigada. Mil vezes, obrigada. A gente sobreviveu á essa porra e deu grandes passos. Este é o caminho, sua sith safada.



Com todo amor e admiração do mundo,



Diana.